STJ Restabelece Progressão para Regime Aberto e Afasta Exame Criminológico Obrigatório em Caso de Furto de Fraldas

Brasília, 15 de maio de 2025 – Em uma decisão que reafirma a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a aplicação da lei penal no tempo e os requisitos para a progressão de regime, o Ministro MESSOD AZULAY NETO concedeu habeas corpus de ofício para cassar acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) e restabelecer a decisão de primeira instância que havia deferido a progressão para o regime aberto a um apenado.

O caso em questão envolve o paciente E., que cumpre pena de 7 anos, 10 meses e 5 dias por dois crimes de furto. 

Advogado Eliseu: (11) 98108-1190

Segundo informações contidas nos autos, o paciente já havia cumprido grande parte de sua pena e atingido o lapso temporal necessário para a progressão ao regime aberto em 30 de dezembro de 2024. Um dos furtos pelos quais foi condenado envolveu a subtração de fraldas infantis de um veículo dos Correios.

A defesa do paciente Dr Eliseu Minichillo de Araújo informou que a progressão para o regime aberto foi inicialmente deferida pela magistrada de primeira instância. A decisão considerou que o paciente preenchia tanto os requisitos legais quanto os subjetivos para o benefício, incluindo a comprovação de boa conduta carcerária. A defesa argumentou que, nesse contexto, não seria necessário um exame criminológico para a concessão da progressão.

No entanto, o Ministério Público interpôs agravo contra essa decisão. O MP requereu o retorno do paciente ao regime semiaberto e a realização obrigatória de exame criminológico. O recurso ministerial foi provido pela 10ª Câmara de Direito Criminal do TJSP. A defesa, contudo, alegou que a decisão do Tribunal paulista carecia de fundamentação adequada e não analisou as teses apresentadas pela defesa.

Entre os argumentos defensivos, destacou-se a inaplicabilidade da Resolução nº 36 de 2024 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária ao caso do paciente E., uma vez que os fatos que levaram à sua condenação são anteriores à promulgação da Lei nº 14.843/2024, que instituiu novas regras para o exame criminológico. A defesa sustentou que a nova lei, por ser mais gravosa, não poderia retroagir para prejudicar o réu, em respeito ao princípio constitucional da irretroatividade da lei penal mais severa (art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal).

Adicionalmente, a defesa apontou que, mesmo que o exame fosse considerado aplicável, a Resolução nº 36/2024 estabelece que ele deveria ser concluído com antecedência mínima de 30 dias da data prevista para a progressão de regime, e que o atraso na sua realização não poderia prejudicar o paciente. A defesa reforçou que o paciente E. sempre manteve
bom comportamento carcerário, retornou de todas as saídas temporárias, trabalhou e obteve remições de pena, cumprindo rigorosamente as exigências legais.

Em sede de pedido liminar no habeas corpus impetrado no STJ, a defesa Dr. Eliseu Minichillo de Araújo solicitou a suspensão da ordem de regresso do paciente ao cárcere até o julgamento final do processo, argumentando que o paciente está trabalhando e possui filhos menores de 12 anos que dependem dele. No mérito, o pedido era para que o paciente permanecesse cumprindo pena em regime aberto sem a necessidade do exame criminológico, conforme a Resolução nº 36 de 2024 e o entendimento pacífico dos tribunais superiores.

Ao analisar o caso, o Ministro MESSOD AZULAY NETO inicialmente observou que o habeas corpus foi impetrado como substituto de recurso próprio, o que, em regra, impede seu conhecimento, conforme orientação consolidada pela 3ª Seção do STJ e pelo Supremo Tribunal Federal. No entanto, o Ministro ressaltou a possibilidade de concessão da ordem de ofício quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado, em observância ao § 2º do artigo 654 do Código de Processo Penal.

E foi exatamente essa flagrante ilegalidade que o Ministro MESSOD AZULAY NETO vislumbrou no acórdão proferido pelo TJSP. O Tribunal paulista havia afastado o benefício da progressão e determinado a realização do exame criminológico com base na Lei nº 14.843/2024 e no “histórico prisional” do paciente.

O Ministro MESSOD AZULAY NETO citou julgados relevantes do STJ, incluindo um proferido pelo Ministro Otávio de Almeida Toledo (HC n. 939.570/MG, julgado em 05/11/2024) e outro da Quinta Turma (AgRg no HC n. 929.034/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, julgado em 30/09/2024), que tratam da aplicação da Lei nº 14.843/2024. Esses precedentes firmaram o entendimento de que as alterações trazidas por essa lei, especialmente a que tornou o exame criminológico obrigatório para a progressão de regime (nova redação do art. 112, § 1º, da LEP), configuram novatio legis in pejus (lei nova
prejudicial ao réu). Desse modo, tais disposições não podem ser aplicadas retroativamente a fatos criminosos cometidos antes da entrada em vigor da lei.

No caso do paciente E., suas condenações são anteriores à Lei nº 14.843/2024, o que, segundo o entendimento do STJ, impede a aplicação retroativa da obrigatoriedade do exame criminológico.
O Ministro MESSOD AZULAY NETO também abordou a questão da exigência do exame criminológico em casos anteriores à nova lei. Ele lembrou que, antes da Lei nº 14.843/2024, o exame não era requisito obrigatório, mas podia ser admitido em hipóteses excepcionais para aferir o requisito subjetivo, desde que houvesse decisão motivada baseada nas peculiaridades do caso, conforme a Súmula nº 439 do STJ. Contudo, a jurisprudência do STJ é firme no sentido de que o afastamento do requisito subjetivo para a progressão de regime deve ser embasado em elementos concretos extraídos da execução da pena. A gravidade abstrata do crime, a longa pena a cumprir ou a reincidência, por si só, não constituem fundamentos idôneos para justificar a necessidade
do exame ou para negar o benefício. O julgador deve indicar fatos específicos ocorridos durante o cumprimento da pena que demonstrem a ausência do requisito subjetivo.


No caso analisado pelo Ministro MESSOD AZULAY NETO, embora o acórdão do TJSP tenha mencionado o “histórico prisional”, não efetuou qualquer juízo de valor concreto sobre ele. O Ministro verificou que o boletim de fls. 16-27 dos autos não apontava a existência de qualquer falta grave cometida pelo paciente durante a execução da pena. Portanto, os fundamentos utilizados pelo Tribunal de origem não foram considerados idôneos para
afastar a presença do requisito subjetivo. Diante da flagrante ilegalidade constatada, que colocava o acórdão do TJSP em desconformidade com o entendimento dominante do STJ sobre o tema, o Ministro MESSOD AZULAY NETO aplicou o enunciado da Súmula nº 568 do STJ, que permite ao relator, monocraticamente, dar ou negar provimento ao recurso quando houver
entendimento dominante sobre a matéria. Assim, o Ministro MESSOD AZULAY NETO decidiu não conhecer do habeas corpus como substituto recursal, mas concedeu a ordem de ofício para cassar o acórdão impugnado do TJSP e restabelecer integralmente a decisão proferida pelo Juízo da Execução Penal que havia deferido a progressão de regime ao paciente E.

A decisão do Ministro MESSOD AZULAY NETO, datada de 13 de maio de 2025 e
publicada no DJEN/CNJ em 15 de maio de 2025, reforça a importância da análise individualizada e baseada em fatos concretos na execução penal, bem como a proteção contra a retroatividade de leis penais mais gravosas, garantindo que as novas exigências legais não prejudiquem aqueles cujos crimes foram cometidos sob a égide da legislação anterior. A origem foi intimada com urgência para cumprimento da decisão.